Por fim eu encontrara alguma coisa em que era realmente bom. O Vingança da Rainha Ana
respondia ao meu comando. Eu sabia que cordas içar, que velas levantar,
em que direção pilotar. Avançamos nas ondas a uma velocidade que
estimei em cerca de dez nós. Eu até entendia perfeitamente como aquilo
era rápido. Para um navio à vela, extremamente veloz. Tudo parecia
perfeito – o vento no rosto, as ondas quebrando na proa. Mas, agora que
estávamos fora de perigo, eu só pensava na falta que Tyson me fazia, e
em como estava preocupado com Grover.
Não conseguia me recuperar da
tremenda trapalhada que tinha leito na ilha de Circe. Se não fosse por
Annabeth, ainda seria um roedor, escondido em uma casinha com um bando
de piratas fofinhos e peludos. Ficava pensando no que Circe dissera: Está vendo, Percy? Você revelou seu verdadeiro eu!
Eu ainda me sentia transformado. Não só porque de repente tinha vontade
de comer alface. Estava inquieto, como se o instinto de ser um
animalzinho assustado fosse agora parte de mim. Ou talvez sempre tivesse
estado ali. É o que de fato me preocupava. Navegamos noite adentro.
Annabeth tentou me ajudar a manter a vigilância, mas navegar não era
para ela. Depois de algumas horas balançando de um lado para outro, seu
rosto estava da cor de guacamole e ela foi para baixo, deitar numa rede.
Eu observava o horizonte. Avistei monstros mais de uma vez. Um jorro de
água alto como um arranha-céu foi cuspido à luz da lua. Uma fileira de
saliências verdes e pontudas serpenteou nas ondas – algo com talvez
trinta metros de comprimento, reptiliano. Eu não queria saber. Uma vez
vi nereidas, os espíritos femininos luminescentes do mar. Tentei acenar,
mas elas desapareceram nas profundezas e fiquei sem saber se tinham ou
não me visto. Pouco depois da meia-noite Annabeth subiu para o convés.
Estávamos passando por uma ilha vulcânica fumegante. Na costa, o mar
borbulhava e o vapor subia.
– Uma das forjas de Hefesto – disse Annabeth. – Onde ele faz seus monstros de metal.
– Como os touros de bronze?
Ela fez que sim.
– Dê a volta. Passe bem longe.
Ela não precisou dizer duas vezes. Navegamos afastados da ilha, que logo
era apenas uma mancha vermelha de neblina atrás de nós. Olhei para
Annabeth.
– A razão da raiva que tem dos ciclopes... a história sobre como Thalia realmente morreu. O que aconteceu?
Era difícil ver sua expressão no escuro.
– Acho que você merece saber – disse ela afinal. Na noite em que Grover
estava nos escoltando para o acampamento, ele ficou confuso, errou o
caminho algumas vezes. Lembra que ele lhe contou isso?
Eu concordei.
– Bem, o pior erro levou à cova de um ciclope no Brooklyn.
– Eles têm ciclopes no Brooklyn? – perguntei.
– Você não acreditaria quantos, mas não se trata disso. Esse ciclope,
ele nos enganou. Conseguiu nos separar dentro de um labirinto de
corredores em uma casa velha em Flatbush. E conseguia falar com a voz de
qualquer um, Percy. Exatamente como Tyson fez a bordo do Princesa Andrômeda.
Ele nos atraiu, um de cada vez. Thalia pensou que estava correndo para
salvar Luke. Luke pensou ter me ouvido gritar por socorro. E eu... eu
fiquei sozinha no escuro. Tinha sete anos. Não conseguia nem achar a
saída. – Ela afastou o cabelo do rosto. – Lembro que encontrei a sala
principal. Havia ossos espalhados por todo o piso. E lá estavam Thalia,
Luke e Grover, com as mãos amarradas e amordaçados, pendurados no teto
como presunto defumado. O ciclope estava acendendo um fogo bem ali no
piso. Puxei minha faca, mas ele me ouviu. Virou-se e sorriu. Ele falou
e, de algum modo, conhecia a voz do meu pai. Acho que simplesmente a
extraiu da minha cabeça. Ele disse: "Agora, Annabeth, não se preocupe.
Eu amo você. Você pode ficar aqui comigo. Você pode ficar para sempre."
Eu estremeci. O modo como ela contou aquilo – mesmo ali, seis anos
depois – me apavorou mais que qualquer história de fantasma que já
ouvira.
– O que você fez?
– Eu o esfaqueei no pé.
Olhei para ela.
– Você está brincando? Tinha sete anos e esfaqueou um ciclope adulto no pé?
– Ah! Ele teria me matado. Mas eu o surpreendi. Isso só me deu tempo de
correr até Thalia e cortar as cordas das mãos dela. Daí em diante, ela
assumiu.
– Sim, mas ainda assim... foi muita coragem, Annabeth.
Ela sacudiu a cabeça.
– Foi por pouco que escapamos. Ainda tenho pesadelos, Percy. O modo como
o ciclope falou com a voz do meu pai. Foi por causa dele que demoramos
tanto para chegar ao acampamento. Todos os monstros que estavam nos
perseguindo tiveram tempo de nos alcançar. Na verdade, foi por isso que
Thalia morreu. Se não fosse aquele ciclope, ela ainda estaria viva.
Nós nos sentamos no convés, observando a constelação de Hércules erguer-se no céu.
– Vá para baixo – disse Annabeth por fim. – Você precisa descansar um pouco.
Eu assenti. Meus olhos estavam pesados. Mas quando cheguei embaixo e
encontrei uma rede levei muito tempo para adormecer. Fiquei pensando na
história de Annabeth. Se eu fosse ela, pensei, será que teria coragem
para partir naquela missão, de navegar para a cova de outro ciclope?
Eu não sonhei com Grover. Em vez disso, estava de volta ao camarote de Luke a bordo do Princesa Andrômeda.
As cortinas estavam abertas. Do lado de fora era noite. Sombras giravam
no ar. Vozes sussurravam à minha volta – espíritos dos mortos.
Cuidado, elas sussurravam. Armadilhas. Ardis. O sarcófago
de ouro de Cronos brilhava discretamente – a única fonte de luz no
recinto. Um riso frio me assustou. Parecia vir de quilômetros abaixo do
navio. Você não tem coragem, jovenzinho. Não pode me deter. Eu
sabia o que tinha de fazer. Precisava abrir aquele caixão. Destampei
Contracorrente. Fantasmas esvoaçavam à minha volta como um tornado. Cuidado!
Meu coração batia forte. Eu não conseguia obrigar meus pés a se mexer,
mas tinha de deter Cronos. Precisava destruir o que quer que estivesse
naquela caixa. Então uma menina falou bem ao meu lado:
– E então, Cabeça de Alga?
Olhei, esperando ver Annabeth, mas a menina não era ela. Usava roupas
estilo punk com correntes de prata nos pulsos. Tinha cabelo preto
espetado, delineador escuro em volta dos olhos azuis tempestuosos e
sardas espalhadas no nariz. Parecia conhecida, mas eu não sabia muito
bem por quê.
– E então? – perguntou. – Você vai detê-lo ou não?
Eu não conseguia responder. Não conseguia me mexer. A menina revirou os olhos.
– Ótimo. Deixe comigo e Aegis. Ela tocou seu pulso e as correntes de
prata se transformaram – achatando-se e se expandindo em um enorme
escudo. Era de prata e bronze, com a cara monstruosa da Medusa se
projetando do centro. Parecia uma máscara mortuária, como se a
verdadeira cabeça da górgona tivesse sido prensada no metal. Eu não
sabia se aquilo era de verdade ou se o escudo podia de fato me
transformar em pedra, mas desviei o olhar. Só o fato de estar perto
daquilo me deixava gelado de medo. Tive a sensação de que, numa luta de
verdade, derrotar o portador daquele escudo seria quase impossível.
Qualquer inimigo daria meia-volta e sairia correndo. A menina puxou sua
espada e avançou para o sarcófago. Os fantasmas escuros se separaram
para deixá-la passar, espalhando-se frente à terrível aura de seu
escudo.
– Não – tentei adverti-la. Mas ela não me deu ouvidos. Marchou direto
para o sarcófago e empurrou a tampa dourada para o lado. Por um momento
ficou ali parada, olhando fixamente para o que havia dentro da caixa. O
caixão começou a brilhar.
– Não. – A voz da menina tremia. – Não pode ser. Das profundezas do
oceano, Cronos riu tão alto que fez tremer o navio inteiro. – Não! – A
menina gritou, e o sarcófago a engoliu em uma explosão de luz dourada.
– Ah! – Sentei na rede em um salto.
Annabeth me sacudia.
– Percy, você estava tendo um pesadelo. Precisa levantar!
– O que... o que foi? – esfreguei os olhos. – O que está errado?
– Terra – disse ela num tom soturno. – Estamos nos aproximando da ilha das sereias.
Mal pude distinguir a ilha à nossa frente – apenas um ponto escuro na névoa.
– Quero que me faça um favor – disse Annabeth. – sereias... estaremos ao alcance do canto delas em breve.
Lembrei-me das histórias sobre as sereias. Elas cantavam modo tão
encantador que sua voz enfeitiçava os marinheiros e os seduzia para a
morte.
– Sem problemas – assegurei-lhe. – Podemos simplesmente tapar os
ouvidos. Há um grande barril de cera de vela no convés de baixo...
– Eu quero ouvi-las.
Eu pisquei.
– Por quê?
– Dizem que as sereias cantam a verdade sobre o que a gente deseja.
Contam coisas a seu respeito que nem você mesmo percebe. É isso que é
tão encantador. Se você sobrevive... se torna mais sábio. Eu quero
ouvi-las. Quantas vezes terei uma oportunidade dessas?
Vindo da maioria das pessoas, aquilo não teria feito sentido. Mas sendo
Annabeth quem era – bem, ela se empenhava em livros de arquitetura grega
antiga e gostava de documentários do History Channel, acho que as
sereias também podiam interessar. Ela me contou seu plano. Com
relutância, ajudei-a a se preparar. Assim que avistamos a costa rochosa
da ilha, ordenei a uma das cordas que se enrolasse na cintura de
Annabeth, amarrando-a ao mastro principal.
– Não me desamarre – disse ela – não importa o que aconteça nem quanto
eu implore. Minha vontade vai ser correr para a amurada e me jogar.
– Você está querendo me tentar?
– Ha-ha.
Prometi que a manteria segura. Então peguei duas grandes bolas de cera
de vela e amassei até que tivessem o formato de tampões, que enfiei nos
ouvidos. Annabeth assentiu com sarcasmo, dando a entender que os tampões
de ouvido eram a última moda. Fiz uma careta para ela e fui para o
timão.
O silêncio era assustador. Eu não conseguia ouvir nada a não ser o
sangue correndo na minha cabeça. Quando nos aproximamos da ilha, rochas
pontiagudas assomaram no nevoeiro. Ordenei ao Vingança da Rainha Ana que as contornasse. Se chegássemos mais perto, aquelas rochas iriam retalhar o casco como lâminas de liquidificador.
Dei uma olhada para trás. De início, Annabeth pareceu totalmente normal.
Depois ficou com uma expressão intrigada. Seus olhos se arregalaram.
Ela forçou as cordas. Chamou meu nome – eu sabia só de ler seus lábios.
Sua expressão era clara: precisava se soltar. Era questão de vida ou
morte. Eu tinha de soltá-la das cordas imediatamente. Parecia tão infeliz que foi difícil não libertá-la. Forcei-me a desviar os olhos. Encorajei o Vingança da Rainha Ana
a ir mais depressa. Eu ainda não conseguia ver a ilha muito bem –
apenas nevoeiro e rochas – mas flutuando na água havia pedaços de
madeira e fibra de vidro, destroços de velhos navios, e até alguns
assentos flutuantes de aviões. Como a música podia desviar tantas vidas
de seu curso? Quer dizer, com certeza havia algumas canções entre as
mais tocadas que me faziam querer mergulhar nas chamas em queda livre,
mas ainda assim... Sobre o que as sereias deviam cantar? Por um momento
perigoso entendi a curiosidade de Annabeth. Fiquei tentado a tirar os
tampões de ouvido, só para ter ideia da canção. Podia sentir as vozes
das sereias vibrando no madeirame do navio, pulsando em meus ouvidos
junto com o ruído do sangue. Annabeth implorava. Lágrimas escorriam em
seu rosto. Lutava com as cordas como se a estivessem impedindo de
alcançar tudo que mais importava para ela. Como pode ser tão cruel?, parecia me perguntar. Pensei que fosse meu amigo.
Olhei fixamente para a ilha enevoada. Tive vontade de destampar minha
espada, mas não havia nada contra o que lutar. Como se luta contra uma
canção? Tentei muito não olhar para Annabeth. Consegui fazer isso por
cerca de cinco minutos. Foi meu grande erro. Quando não pude aguentar
mais, olhei para trás e encontrei... uma pilha de cordas cortadas. Um
mastro vazio. A faca de bronze de Annabeth estava caída no convés. De
algum modo, ela conseguira se contorcer até pegá-la. Tinha me esquecido
completamente de desarmá-la. Corri para a amurada do barco e a vi dando
braçadas desesperadas em direção à ilha, as ondas a arrastando direto
para as rochas pontiagudas. Gritei seu nome, mas, se ela me ouviu, de
nada adiantou. Estava hipnotizada, nadando rumo à morte. Olhei para o
timão atrás de mim e gritei:
– Pare!
E então pulei da amurada. Caí na água e ordenei que a correnteza
contornasse meu corpo, num fluxo que me atirou para a frente. Cheguei à
superfície e avistei Annabeth, mas uma onda a pegou, arrastando-a por
entre duas presas de pedra afiadas como navalhas. Não tive escolha.
Lancei-me atrás dela. Mergulhei por baixo do casco destroçado de um
iate, trancei por entre uma coleção de bolas flutuantes de metal presas a
correntes que, depois, percebi que eram minas.Tive de usar todo o meu
poder sobre as águas para evitar que fosse esmagado contra as rochas ou
preso nas redes de arame farpado esticadas logo abaixo da superfície.
Atirei-me entre as duas presas de pedra e me vi em uma baía em forma de
meia-lua. A água estava atulhada de mais rochas, destroços de navios e
minas flutuantes. A praia era de areia negra vulcânica. Olhei em volta
desesperado, à procura de Annabeth. Ali estava ela. Por sorte ou por
azar, era boa nadadora. Conseguira passar pelas minas e pelas rochas.
Estava quase na praia negra. Então o nevoeiro se espalhou e eu as vi as
sereias.
Imagine um bando de abutres do tamanho de pessoas – com plumagem preta
enlameada, garras cinzentas e pescoço rosado e enrugado. Agora imagine
cabeças humanas em cima desses pescoços, mas as cabeças humanas ficavam
mudando. Eu não conseguia ouvi-las, mas podia ver que estavam cantando.
Enquanto as bocas se moviam, os rostos se transformavam nos de pessoas
que eu conhecia – minha mãe, Poseidon, Grover, Tyson, Quíron. Todas as
pessoas que eu mais queria ver. Elas sorriam de modo tranquilizador,
convidando-me a prosseguir. Mas, não importava que forma tomassem, as
bocas eram gordurosas, recobertas de restos de antigas refeições. Como
abutres, enfiavam a cara na comida, e tudo levava a crer que não tinham
se banqueteado na Donuts Monstro. Annabeth nadava na direção delas. Eu
sabia que não podia deixá-la sair da água. O mar era minha única
vantagem. Sempre me protegera, de um jeito ou de outro. Impeli o corpo
para a frente e agarrei o tornozelo dela.
No momento em que a toquei, um choque atravessou meu corpo, e vi as
sereias do modo como Annabeth devia estar vendo. Três pessoas sentadas
sobre uma toalha de piquenique no Central Park. Havia um banquete
espalhado na frente delas. Reconheci o pai de Annabeth pelas fotos que
ela me mostrara – um cara de aparência atlética, cabelos cor de areia,
com seus quarenta anos. Estava de mãos dadas com uma linda mulher muito
parecida com Annabeth. Ela estava vestida de modo informal – calça
jeans, blusa de algodão e botas de caminhada – mas algo na mulher
irradiava poder. Sabia que estava olhando para a deusa Atena. Ao lado
dela sentava-se um rapaz... Luke. Toda a cena estava iluminada por uma
luz cálida, amanteigada. Os três conversavam e riam, e quando viram
Annabeth seus rostos se iluminaram de satisfação. A mãe e o pai
estenderam as mãos de modo convidativo. Luke sorriu e fez um gesto para
que Annabeth sentasse a seu lado – como se ele nunca a tivesse traído,
como se ainda fosse seu amigo. Atrás das árvores do Central Park
erguia-se a silhueta de uma cidade. Perdi o fôlego, porque era
Manhattan, mas não era Manhattan. Estava totalmente reconstruída
em mármore branco, deslumbrante, maior e mais grandiosa que nunca – com
janelas douradas e jardins suspensos. Era melhor que Nova York. Melhor
que o Monte Olimpo. Soube imediatamente que Annabeth a projetara
inteira. Ela era a arquiteta de todo um novo mundo. Ela reunira os pais.
Salvara Luke. Tinha feito tudo o que sempre quis.
Pisquei com força. Quando abri os olhos, tudo o que vi ali foram as
sereias – abutres horrendos com feições humanas, prontos para devorar
mais uma vítima. Puxei Annabeth de volta para as ondas. Não pude
ouvi-la, mas percebi que estava gritando. Ela me chutou no rosto, mas
continuei segurando. Ordenei às correntes que nos arrastassem para
dentro da baía. Annabeth me esmurrava e me chutava, dificultando minha
concentração. Ela se debateu tanto que quase colidimos com uma mina
flutuante. Eu não sabia o que fazer. Jamais chegaria ao navio, vivo, se
ela continuasse lutando. Afundamos, e Annabeth parou de se debater. Sua
expressão ficou confusa. Então nossas cabeças afloraram e ela começou a
lutar de novo.
A água! O som não se propagava bem embaixo d'água. Se eu conseguisse
submergi-la por tempo suficiente, poderia quebrar o encantamento da
música. É claro, Annabeth não ia conseguir respirar, mas naquele momento
isso parecia ser um problema menor. Agarrei-a pela cintura e ordenei às
ondas que nos empurrassem para baixo. Mergulhamos nas profundezas –
três metros, seis metros. Eu sabia que teria de tomar cuidado, porque
era capaz de suportar muito mais pressão do que Annabeth. Ela lutou e se
debateu para respirar enquanto bolhas subiam à nossa volta.
Bolhas.
Eu estava desesperado. Tinha de manter Annabeth viva. Imaginei todas as
bolhas do mar – sempre se agitando, subindo. Imaginei-as se juntando,
sendo empurradas até mim. O mar obedeceu. Houve um turbilhão de branco,
uma sensação de cócegas, e quando minha visão clareou Annabeth e eu
tínhamos uma enorme bolha de ar ao nosso redor. Apenas as pernas
continuavam mergulhadas em água. Ela engasgou e tossiu. Seu corpo todo
estremeceu, mas quando ela me olhou soube que o encantamento tinha sido
quebrado. Annabeth começou a soluçar – quer dizer, soluços horríveis, de
partir o coração. Encostou a cabeça em meu ombro e eu a abracei. Os
peixes se juntaram para nos olhar – um cardume de barracudas, alguns
espadartes curiosos.
Fora!, disse a eles. Eles se afastaram, mas pude perceber que
saíram relutantes. Juro que entendi as intenções deles. Estavam prestes a
espalhar boatos pelo mar sobre o filho de Poseidon e uma garota no
fundo da baía das sereias.
– Vamos voltar ao navio. Está tudo bem. Apenas aguente firme.
Annabeth balançou a cabeça para me dizer que estava melhor, depois
murmurou algo que não pude ouvir por causa da cera nos ouvidos. Fiz a
corrente manobrar nosso pequeno e estranho submarino de ar por entre as
rochas e o arame farpado, e de volta para o casco do Vingança da Rainha Ana,
que mantinha o curso lento e estável, fugindo do alcance da voz das
sereias. Então subi para a superfície e nossa bolha de ar se desfez.
Ordenei que uma escada de corda descesse por cima do costado do navio, e
subimos a bordo. Mantive meus tampões de ouvido, só por garantia.
Navegamos até a ilha ficar completamente fora de vista. Annabeth ficou
sentada, aconchegando-se em um cobertor no convés dianteiro. Por fim,
ela ergueu os olhos, confusa e triste, e murmurou, salvos. Removi
os tampões. Nenhuma cantoria. A tarde estava silenciosa, a não ser pelo
som das ondas batendo no casco. O nevoeiro desfizera e o céu estava
azul, como se a ilha das sereias nunca tivesse existido.
– Você está bem? – perguntei. No momento em que disse isso, percebi a besteira que tinha falado. É claro que ela não estava bem.
– Eu não sabia – murmurou ela.
– O quê? – Seus olhos estavam da mesma cor que a névoa sobre a ilha das sereias.
– Como a tentação seria poderosa.
Não queria admitir que tinha visto o que as sereias haviam prometido a
ela. Eu me sentia um intruso. Mas imaginei que devesse isso a Annabeth.
– Eu vi o modo como você reconstruiu Manhattan – contei. – E Luke e os seus pais.
Ela corou.
– Você viu aquilo?
– O que Luke lhe disse no Princesa Andrômeda, sobre refazer o mundo do zero... aquilo de fato impressionou você, não é?
Ela se enrolou no cobertor.
– Meu defeito mortal. Foi isso que as sereias me mostraram. Meu defeito mortal é o húbris.
Eu pisquei.
– Aquela coisa marrom que passam nos sanduíches vegetarianos?
Ela revirou os olhos.
– Não, Cabeça de Alga. Aquilo é homus. Húbris é pior.
– O que poderia ser pior do que homus?
– Húbris quer dizer orgulho, insolência, Percy. Achar que você pode
fazer as coisas melhor do que qualquer um... inclusive os deuses. Você
se sente assim? – Ela baixou os olhos. – Nunca teve a impressão de
que... que o mundo realmente está todo errado? E se pudéssemos refazer tudo do começo? Guerras nunca mais. Ninguém sem teto. Nunca mais dever de casa no verão.
– Estou ouvindo.
– Quer dizer, o Ocidente representa muitas das melhores coisas que a
humanidade já fez... é por isso que a chama ainda arde. E por isso que o
Olimpo ainda existe. Mas, às vezes, a gente só vê o que não presta,
entende? E começa a pensar do mesmo jeito que Luke: "Se conseguir
destruir tudo isso, posso fazer melhor." Nunca se sentiu assim? Como se
você pudesse fazer um serviço melhor se fosse o dono do mundo?
– Humm... não. Eu governando o mundo seria uma espécie de pesadelo.
– Então você tem sorte. O húbris não é seu defeito mortal.
– E o que é?
– Não sei, Percy, mas todo herói tem um. Se você não descobrir e
aprender a controlá-lo... bem, não é à toa que o chamam de "mortal".
Pensei naquilo. E não fiquei lá muito animado. Também notei que Annabeth
não falou muito sobre as coisas particulares que ela mudaria – como
conseguir reunir os pais, ou salvar Luke. Eu entendi. Não queria admitir
quantas vezes sonhara em reunir meus pais. Imaginei minha mãe, sozinha
em nosso pequeno apartamento no Upper East Side. Tentei me lembrar do
cheiro dos seus waffles azuis na cozinha. Parecia tão distante!
– E então, valeu a pena? – perguntei a Annabeth. – Você se sente... mais sábia?
O olhar dela se perdeu na distância.
– Não tenho certeza. Mas precisamos salvar o acampamento. Se não pararmos Luke...
Ela não precisou terminar. Se o modo de pensar de Luke podia tentar até
Annabeth, não dava para imaginar quantos outros meios-sangues poderiam
juntar-se a ele. Pensei no sonho com a menina e o sarcófago dourado. Não
sabia muito bem o que significava, mas tive a sensação de que estava
deixando alguma coisa passar. Alguma coisa terrível que Cronos
planejava. O que a menina tinha visto quando abriu a tampa do caixão? De
repente os olhos de Annabeth se arregalaram.
– Percy.
Eu me virei. A frente havia uma outra mancha de terra – uma ilha em
forma de seta com colinas cobertas de florestas, praias de areia branca e
campinas verdes – exatamente como eu tinha visto em meus sonhos. Meus
sentidos náuticos confirmaram. 30 graus e 31 minutos Norte, 75 graus e
12 minutos Oeste. Tínhamos chegado ao lar do ciclope.
1° momento percabeth
ResponderExcluirTbm pensei nisso rs
ExcluirAmoo
ExcluirEu considero a cena do porquinho de Índia um capítulo antes daqui como percabeth 1
ExcluirAff...eles dois são muito lindos😍😍😍
ResponderExcluirSão mesmo
ExcluirSIM RSRS
ExcluirPercabeth ,torço muito pra esse casal!!muito lindos😍
ResponderExcluirE eu Aki só pensando em cadê a Clarisse
ResponderExcluirss kkkkk
ExcluirTbm man
Excluireu tbm, fiquei tipo ué, será que a Clarisse morreu?
ExcluirMano leu a minha mente kkkkk
ExcluirEis que você já leu todos os livros umas 30 mil vezes mas ainda sente a mesma aflição, a mesma ansiedade de saber o que passará no capítulo seguinte como se fora a primeira vez.
ResponderExcluirVelho tô lendo tudo dnv mas é a mesma emoção
ExcluirSiiim!! sou MT apaixonada nessa(s) sagas pqp
Excluiragora a coisa vai ficar feia
ResponderExcluirDms amo kkkkkk
Excluirvei, eu sei que eles vão namorar maaaas ai eles são só amigos eu faria isso pelos meus amigos kk
ResponderExcluirEles vão namorar kkkkk
ExcluirEu sou tipo os peixes fora da bolha
ResponderExcluirEu querendo saber o que ela falou enquanto ele não estava ouvindo: (MDS!!! O quê?!!!)
ResponderExcluirEu também quero saber cara, sera que ela falou obrigada? Ou algo do tipo?( ou ela se aproveitou pra se confessar pra ele em quanto ele não tava ouvindo 😏)
ExcluirOlha vou admitir... Estou lendo o livro enquanto ouço um audiobook... Assim fica bem melhor de entender kkk
ResponderExcluirPercabeth são tão fofos meu Deus
ResponderExcluir